
Alcançar uma média de consumo de 18 km/l com etanol em veículos modernos a combustão se tornou um feito quase impossível, mesmo em condições ideais de estrada. Contudo, essa realidade já foi uma prática comum. Há mais de quatro décadas, a Volkswagen promoveu um evento notável: uma competição de economia entre 520 taxistas em São Paulo, utilizando o recém-lançado Gol movido a etanol. Surpreendentemente, a dupla vencedora alcançou a marca de 18,32 km/l.
De acordo com um anúncio da montadora alemã em 1982, os participantes do ‘Torneio de Economia VW Gol a Álcool’ percorreram um trajeto de 37,2 km, com 85% do percurso em vias urbanas. Mas, o que mudou para que o etanol não consiga atingir o mesmo nível de rendimento nos dias de hoje? Renato Romio, engenheiro do Instituto Mauá de Tecnologia, aponta que as rigorosas exigências de controle de emissões de poluentes e a tecnologia dos motores flex, inexistentes no Brasil naquela época, são os principais fatores.
Atualmente, o consumo de álcool é, em média, 30% maior em comparação com a gasolina. No passado, essa diferença era de aproximadamente 15%, conforme explica o especialista. É importante lembrar que, antigamente, os consumidores brasileiros precisavam escolher entre veículos movidos exclusivamente a gasolina, etanol ou diesel.
Romio destaca que, nos anos 80, os carros a álcool eram consideravelmente mais econômicos devido ao ajuste do motor para trabalhar com uma mistura pobre, utilizando menos etanol em relação à quantidade de ar na combustão. Isso permitia que o etanol atingisse 85% da eficiência energética da gasolina, em comparação com os 70% atuais.
Essa estratégia era adotada pela VW e outras montadoras devido às características físico-químicas do etanol, que contém oxigênio e, portanto, queima mais rapidamente, mesmo em menor quantidade. Isso compensava em parte seu menor poder calorífico em comparação com a gasolina, que não possui oxigênio em sua composição. No entanto, com a criação do Proconve (Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores) em meados da década de 1980 e a adoção do catalisador para controle de emissões veiculares a partir do início da década seguinte, o cenário mudou.
Para que o catalisador funcionasse adequadamente, foi necessário equilibrar a quantidade de ar e etanol para a queima no motor, o que levou a um maior consumo. A mistura se tornou mais rica, como já acontecia com a gasolina, explica Renato Romio.
A introdução dos motores flex também contribuiu para a redução da autonomia com etanol. Romio explica que o álcool apresenta melhor rendimento em taxas de compressão mais altas, o que não é viável com gasolina. Por essa razão, os motores flex requerem um ajuste para trabalhar com uma taxa de compressão intermediária, sem mencionar que a gasolina já contém 27% de álcool em sua composição.
Essa solução que permite o abastecimento com qualquer um dos combustíveis, inclusive misturados em qualquer proporção, impede que ambos atinjam seu potencial máximo. Uma possível solução seria voltar a oferecer motores movidos exclusivamente a álcool.
Há alguns anos, a antiga FCA, agora parte da Stellantis, anunciou o desenvolvimento de um motor turbo 100% a etanol, visando reduzir a diferença em relação aos motores a gasolina em termos de consumo. No entanto, o projeto foi cancelado, possivelmente devido à resistência dos consumidores à ideia de depender exclusivamente do etanol, cuja produção está sujeita a variações sazonais, climáticas e ao preço do açúcar.
Renato Romio conclui que um motor dedicado ao álcool teria um menor consumo em comparação com os motores flex, mas não atingiria os 85% de eficiência em relação à gasolina, como ocorria há 40 anos, antes da introdução do catalisador. Atualmente, um motor a álcool poderia chegar próximo a 80% de eficiência.




